28 outubro 2005

O Papel Político de Jan Hus

João Hus (por volta de 1370-1415) apresenta-se, tanto no campo da religião quanto na vida política, marcado por pensamentos confusos. Ele não foi um pensador político, não foi também um grande teólogo. Também não foi original. O essencial de sua teologia vem de Wycliff. Encontrando-se em contato direto com o nascimento do sentimento nacional na Boêmia, em oposição à dominação alemã, conseguiu reunir em torno de si burgueses, intelectuais, camponeses e uma parte da nobreza. Tudo isso em virtude da divulgação da teologia da Wycliff, a qual contrariava o poderio da Igreja. O seu pensamento político pode ser reproduzido em quatro pontos.

O primeiro é concernente à Igreja, cuja reforma basear-se-ia no devotio moderna, ou seja, os cristãos devem seguir o exemplo de Cristo em uma relação direta, pessoal, com Deus, passando a organização Igreja para um segundo plano. Apregoava que a Igreja não tinha autoridade divina e, portanto, dever-se-ia lutar contra a imoralidade e a ignorância do clero e recolocar a massa dos fiéis em contato direto com o poder. Queria acabar com os privilégios sacerdotais, inclusive, eliminando o latim, a fim de que todos pudessem entender o verbo divino.

Um segundo grande ponto do pensamento político de Hus é a importância que ele dá à Universidade. Ele estima que se a Universidade for bem estruturada, os alunos receberão orientação adequada e poderão ser os futuros reformadores do quadro político e social de sua nação. Daí sua luta para mudar a direção da Universidade, no sentido de oferecer um maior número de vozes à nação Boêmia e ao partido reformador.

O terceiro e mais significativo aspecto de seu pensamento político é a sua tendência constante a relacionar tudo com o povo. Quando chegava uma mensagem do Concílio, Hus a lia em assembleia popular. A sua pregação sobre a liberdade era contínua. Orientava, assim, o povo para os riscos de se resistir às autoridades injustas. Para ele o que compõe a Igreja justa são os pobres e a multidão dos crentes que são a autoridade última. O afã de tudo tornar público, fê-lo responder à excomunhão maior da Cúria, com o "apelo último": o único juiz legítimo é Jesus Cristo e não o papa ou Concílio.

O quarto ponto refere-se ao duplo movimento de ruptura e de continuidade entre o cristianismo e o poder. Ruptura, no sentido de não deixar a religião justificar nem tampouco legitimar nenhum poder, nenhuma dominação, nenhuma desigualdade. É a partir da revelação que o homem deve julgar as autoridades. Mas a principal relação é que, para Hus, a liberdade cristã deve produzir a liberdade política, e esta no que concerne ao povo checo, se deve inscrever dentro da liberdade nacional.

João Hus, grande propagador da liberdade religiosa e política, sempre dizia que a liberdade tem poucas chances de sucesso. Eis que, vê consumado em si mesmo o que mais temia: morreu queimado no dia 06/07/1415, por ordem do clero.

Fonte de Consulta

CHÂTELET, F., DUHAMEL, O. e PISIER, E. Doutrina de Obras Políticas. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1993.

 

23 outubro 2005

Jean Jacques Rousseau

“O homem nasce livre, mas por toda parte encontra-se acorrentado.” Jean Jacques Rousseau

Jean Jacques Rousseau nasceu em Genebra a 28 de junho de 1712 e morreu em Ermenonville a 2 de julho de 1778. Escritor francês de origem suíça, teve uma vida bastante atribulada: ao nascer, morreu-lhe a mãe; foi educado por um pastor; teve Madame Warrens como amante; foi preso e refugiou-se na Inglaterra. Além de escritor político e social, dedicou-se também à música e à poesia.

O Discurso sobre a Origem da Desigualdade entre os Homens, em 1754, trata da desigualdade e da injustiça como frutos de uma hierarquia mal constituída. Nessa obra, Rousseau afirma que a organização social não corresponde à verdadeira natureza humana, corrompendo-a e sufocando o seu potencial. A Nova Heloísa, em 1761, exalta o direito da paixão, mesmo quando ilegítima, contra a hipocrisia da sociedade. A mentira seria um produto social. É romance filosófico que exalta a pureza em luta contra uma ordem social corrompida e injusta.

Dentre os vários escritos de Rousseau, sobressaíram os Do Contrato Social e Emílio ou da Educação, em 1762. No Contrato Social, retrata o Estado ideal alicerçado na vontade geral, onde cada um, através de um pacto social, cede, de si, para a felicidade da nação. No Emílio ou da Educação, há um questionamento sobre o método da educação vigente na época. Imagina, assim, um pretenso aluno — Emílio — que faz o seu aprendizado, partindo de sua própria natureza, ou seja, de "dentro para fora" e não de "fora para dentro", como era o convencional.

A liberdade foi amplamente veiculada em todos os seus escritos. Para Rousseau, a liberdade era tão importante que toda a sua teoria foi designada para assegurá-la a todos; não na forma de remover coação, mas como uma liberdade positiva para participar na atividade de legislar sobre o bem comum. Assim, em seu pensamento, a lei mais do que a anarquia é que mantém o povo livre. No Contrato Social ele investiga os pressupostos desta liberdade examinando "os homens como eles são" e as "leis como devem ser".

A influência de Rousseau foi tamanha que, no período que antecedia a Revolução Francesa, havia um grupo de intelectuais, pertencente ao Círculo de Ferro, que estudaram exaustivamente cada um dos capítulos do seu livro Do Contrato Social, com o objetivo de formar a opinião da população. Como Rousseau era pessimista, e dizia que todos os homens nascem livres mas em toda a parte se veem acorrentados, eles reelaboram esse conceito, dizendo que se Rousseau estivesse vivo, a revolução seria o único meio libertar as pessoas dessas correntes.

Rousseau foi um defensor da liberdade e da justiça. Estudemo-lo e absorvamos todo o manancial de conhecimentos que jorra de uma alma amante da verdade.

Fonte de Consulta

COLLINSON, D. Fifty Major Philosophers: a Reference Guide. London and New York, Routledge, 1989.


21 outubro 2005

Constituição Planetária

O anteprojeto de Constituição para a Federação do Planeta Terra data de 1977, quando foi formulada uma Assembleia Constituinte Mundial, reunida na Áustria, e composta de 135 participantes de 25 países. Foi publicado na imprensa de Auroville, comunidade internacional localizada na ex-colônia francesa de Pondichèry.

O objetivo deste projeto planetário é conscientizar o mundo que as questões ambientais, hoje, extrapolam as fronteiras nacionais, constituindo-se num problema planetário. Nesse sentido, o conceito tradicional de segurança por meio da defesa militar é uma ilusão total tanto para o presente como para o futuro, que a humanidade é Una, apesar da existência de diversas nações, credos, ideologias e culturas, e que o princípio da unidade na diversidade é a base para uma nova era e na qual a guerra será banida e a paz prevalecerá.

O organograma do Governo terá em seu topo o Parlamento Mundial, subdividido em Judiciário Mundial, Executivo Mundial, Sistema de Vigilância e Ombusdsmen Mundial. Abaixo, nessa ordem hierárquica, teríamos o Complexo Integrado, subdividido em Administração do Serviço Público Mundial, Administração das Fronteiras e Eleições Mundiais, Pesquisa e Planejamento, Administração Financeira Mundial etc. Não se sabe se teríamos um único governo ou vários governos regionais. O que importa é ter um órgão controlador do planeta como um todo.

A operacionalidade desse parlamento mundial se fará através dos órgãos mundiais já existentes, como a ONU, as Nações Unidas, o FMI etc. A utilização destes órgãos parece-nos claro: aproveitar as suas estruturas de cunho planetário. Observe a Organização Mundial da Saúde que, ao elaborar as suas estatísticas sobre doenças, produção de medicamentos, políticas preventivas, alimentação etc., estabelece médias mundiais que podem ser metas para aqueles povos que delas estão se distanciando.

Entre as personalidades mundiais para compartilhar tal ideia, citamos: Jawarharlat Nehru, ex-primeiro ministro da Índia, que disse: "Eu não tenho dúvidas em minha mente de que a federação mundial deve vir e virá, porque não há outro remédio para a doença do mundo"; Teilhard de Chardin, pensador ocidental cristão, que expressou: "A idade das nações já passou. A tarefa diante de nós, agora, se devemos sobreviver, é a de construir o planeta"; Bertrand Russel, que salientou: "A humanidade não chegará ao século XXI caso não se estabeleça alguma forma de governo mundial".

Embora seja um paradigma para o futuro, que é incerto, é importante que sempre estejamos pesando em termos cósmicos.

Fonte de Consulta

ANDRÉS, M. Constituição Planetária. In BRANDÃO, D. M. S. e CREMA, R. (org.) O Novo Paradigma Holístico: Ciência, Filosofia, Arte e Mística. São Paulo, Summus, 1991.

 

 

 

15 outubro 2005

Desvalorização e Especulação

O dinheiro é meio de troca e não sinônimo de riqueza. Se o seu valor permanecer constante, a economia ganha com isso, pois os contratos poderão ser feitos a longo prazo, sem que haja grandes malabarismos para se prever o que acontecerá no futuro. Isso significa que produtores e consumidores podem fazer seus planejamentos sem pressa, buscando o melhor preço, e sem precisar correr para comprar aqui ou ali. Aumentando, porém, o fluxo monetário, o sistema econômico pode se desorganizar porque, aquele que começa remarcando o preço, acaba levando vantagem sobre os demais.

A desvalorização do dinheiro é feita pelo governo com o intuito de transferir poupanças privadas para os cofres públicos. Faz-se muitas vezes por ignorância e outras vezes por incompetência. Observe que as grandes guerras mundiais produziram inflação, desorganizaram o sistema de produção e deram origem ao aparecimento do especulador. O especulador surge como consequência da desvalorização e não como causa. A causa é a má administração financeira do governo.

O Brasil, em meados de janeiro de 1999, desvalorizou o real. Oficialmente em 30%, porém a oscilação do mercado fê-lo chegar aos 80%. O bode expiatório é o especulador. Mas tem ele culpa? Até certo ponto, sim; porém, se não o fizer, poderá perder a sua fatia do mercado e sucumbir. Como o primeiro impacto é um descrédito do governo, muitos são os comerciantes que estão com suas lojas paradas, esperando o que vai acontecer. Por isso, diz-se que "prudência e caldo de galinha não faz mal a ninguém.

Onde buscar as origens da desvalorização cambial brasileira? Observe que quando foi implantado o plano de estabilização do real, deixou-se o mercado ajustar os preços relativos através da URV. Esperava-se estancar a cultura inflacionária brasileira e começar uma nova vida, com moeda nova. Esse era o início; depois, dever-se-ia complementar com as reformas tributária, previdenciária e política. A etapa seguinte não foi feita a contento. Consequência: ficamos todo esse tempo pagando juros altos e vendo nossa dívida interna e externa aumentar desmesuradamente.

A intenção do governo foi boa, ou seja, estancar a ciranda inflacionária; a realidade, outra. É que o custo Brasil ficou alto. As reformas que não foram feitas obrigaram-nos a segurar a estabilidade do real através da âncora cambial, que a grosso modo é valorizar o real em relação ao dólar. Mas isso a um custo altíssimo, pois chega uma hora em que os capitais externos, principalmente, os especulativos já não entram com muita facilidade. Premido por todos os lados, o governo cede ao mercado, e deixa o câmbio flutuar. E deu no que deu: todos falando do dólar.

Governar em tempos de calmaria é fácil. Contudo, o valor de um governante nunca é lembrada pelas proezas da facilidade, mas reconhecida por vencer no mar alto das grandes dificuldades.

 

 

 

14 outubro 2005

Economia Cognitiva

Economia Cognitiva é o título do livro de Thierry Gaudin, engenheiro de minas, politécnico e pesquisador do futuro da França, em que "considera que o essencial não é compreender as transformações da matéria realizadas pela indústria — isto é apenas um resultado —, mas as causas imateriais, que se exprimem principalmente pelos processos de reconhecimento que se encontram na sociedade".

A sua tese fundamenta-se na veiculação dos logiciels, tradução francesa de software (programas e aplicações de informática). De acordo com o autor, há vários logiciels na economia, isto é, oferta e demanda, custo e receita, produção e consumo etc., que podem ser resumidos em três: poder, mercado e inovação. Nesse mister, alerta-nos que quando o poder (monopólio das grandes empresas, inclusive o governo) domina o mercado, a inovação fica esquecida, prejudicando o desenvolvimento cognitivo da pessoa humana.

A análise dos saber-fazer é a pedra de toque da abordagem cognitiva. O saber-fazer está inserido nos comportamentos dos indivíduos e, no caso de uma catástrofe destruir os bens materiais, a sociedade é capaz der reconstruí-los. A especialização moderna, quando comparada à postura do saber-fazer, apresenta-se como um etnocídio, ou seja, a morte de uma cultura. Por que? Porque quando um país importa uma tecnologia estrangeira, ele fica dependente dessa técnica, além de alterar todas as relações internas de troca que havia até então.

Diante do esfacelamento da aplicação das teorias econômicas de 200 anos (máxima receita pelo mínimo custo), propõe uma nova maneira de construir os modelos econômicos, ou seja, enfatiza a desarticulação do poder das grandes corporações, quer seja privada ou pública, para que a inovação do saber-fazer se faça presente. Nesse sentido, levanta, dentre outros, os seguintes temas: ajardinamento do planeta, estruturação das cidades, povoamento dos mares, solidariedade e compartilhamento e fisco incentivador.

O que há de novo na sua maneira de olhar a economia? Apenas deu-lhe o título de economia cognitiva, mas seus raciocínios podem ser encontrados em diversos pensadores. Observe que suas críticas à medição do PIB (poluição aumenta e não diminui o PIB, por exemplo) já foram levantadas por Boulding, que sua humanização do trabalho é semelhante à ideia de conceber o trabalho em termos de significação para a sociedade e não aquilo que dá status social. O mérito do livro está em fazer-nos refletir sobre questões intrínsecas do "conhece-te a ti mesmo", da "autoconsciência" e do "agir sabendo porque está agindo".

Pensar, refletir e propor é louvável, pois auxilia-nos a repensar a teoria econômica ortodoxa, criando o ensejo de mudar os paradigmas, caso já não sirvam mais para a explicação dos fatos econômicos de um mundo globalizado.

Fonte de Consulta

GAUDIN, Thierry. Economia Cognitiva - Uma Introdução. São Paulo, Beca, 1999.

 

12 outubro 2005

Smith, Adam

"A riqueza de uma nação se mede pela riqueza do povo e não pela riqueza dos príncipes." (Adam Smith)

Adam Smith (1723-1790) foi um economista escocês. Aos 14 anos, frequentou a Universidade de Glasgow. Mais tarde, recebeu uma bolsa de estudo e foi para Oxford. Anos depois, voltou para Glasgow e tornou-se, em 1752, professor de Filosofia Moral, disciplina que incluía Teologia Natural, Ética, Jurisprudência e Economia Política. Sua fama era tanta que estudantes da Rússia, França e outros países visitavam-no com a finalidade de receber dele instruções valiosas acerca da moral e da economia. Era também conhecido pelas suas distrações, que o levaram muitas vezes ao ridículo.

A publicação da sua primeira grande obra The Theory of Moral Sentiments (A Teoria dos Sentimentos Morais), em 1759 chegou até às mãos de Charles Townshend, o estadista, e tanto o impressionou que ofereceu a Smith a posição de tutor do jovem Duque de Buccleuch. Smith aceitou a oferta e acompanhando o discípulo, empreendeu grande giro pela Europa. Demorou-se mais na França, entrando em contato com grandes pensadores, principalmente M. Quesnay, que lhe passou todas as conjecturas do seu Tableau Économique.

A riqueza das nações não foi uma obra original na acepção da palavra. Na verdade é o esforço que Adam Smith empreendera para juntar num todo as teorias que os outros seus contemporâneos pinçavam aqui e ali. Queria dar uma resposta mais coerente às indagações levantadas na sua Teoria sobre os Sentimentos Morais, ou seja, como o interesse próprio pode gerar o bem-estar da sociedade. Tenta, também, partindo de uma confusão inicial visualizar o todo harmônico.

Para compreender Adam Smith precisamos colocá-lo dentro do horizonte cultural que vivera. Na época que escrevera A riqueza das nações, a indústria era incipiente, o mercado restrito, a Revolução Industrial inexistia e tampouco o capitalismo. O mais importante é que, embora limitado, conseguiu vislumbrar as leis gerais do mercado, o mecanismo de formação de preço, a lei de oferta e procura etc. Tudo isso era feito sem a intervenção do governo, guiado apenas pela "mão invisível", em que cada qual buscando o seu interesse próprio propiciaria a sobrevivência de todos.

No fim de sua vida, Adam Smith estava repleto de honra e respeito. Em 1790, morre com 67 anos. Curiosamente sua passagem teve pouca notificação. Talvez porque as pessoas estavam preocupadas com a Revolução Francesa e suas repercussões nos condados ingleses. Ele foi enterrado no cemitério Canongate com uma lápide despretensiosa, escrita que Adam Smith, autor de A Riqueza das Nações, jaz aqui.

Eis uma vida que granjeou fama pela sua honestidade e moral elevada. Não resta dúvida que deve ser um exemplo a ser seguido pelos seus pósteros.

Fonte de Consulta

HEILBRONER, R. L. The Wordly Philosophers: the Lives, Times, and Ideas of the Great Economic Thinkers. New York, Washington Square Press, 1968.

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Uma das grandes realizações de A riqueza das nações foi ter corrigido muitas ideias equivocadas do passado. Smith combateu a antiga teoria mercantilista que preconizava o acúmulo pelo Estado de grandes quantidades de barras de ouro. Da mesma forma, seu livro rejeita a afirmação dos fisiocratas da terra enquanto principal fonte de valorização, destacando, ao contrário, a importância básica do trabalho. Smith enfatizou a possibilidade de grande aumento na produção alcançável por meio da divisão do trabalho e atacou todo o conjunto de restrições que impediam a expansão industrial.

A ideia central de A riqueza das nações afirma que o aparentemente caótico mercado livre é, na realidade um mecanismo que se autogoverna e que automaticamente tende a produzir o tipo e a quantidade de bens que são mais desejados e necessários para a comunidade. Por exemplo, suponha-se que haja pouco suprimento de algum bem desejável. Naturalmente, seu preço deverá subir, o que levará a maiores lucros para aqueles que produzem esse bem. Devido aos lucros mais altos, outros produtores tenderão também a fabricar aquele artigo. O aumento de produção resultante deverá, então, acabar com a falta original do bem. Além disso, o aumento da oferta, em conjunto com a competição entre os vários fabricantes, deverá também fazer com que o artigo volte a seu preço natural, ou seja, a seu custo de produção. Ninguém, deliberadamente, tentou ajudar a sociedade, tentando diminuir a falta do artigo; entretanto, o problema foi resolvido. Cada indivíduo, segundo Adam Smith, "só procura seu próprio ganho", mas é como se fosse "levado por mão invisível para produzir um resultado que não fazia parte de sua intenção... Perseguindo seus próprios interesses, frequentemente promove os da sociedade, com mais eficiência do que realmente tivesse interesse de fazê-lo." (A riqueza das nações, Livro IV, capítulo II)

A "mão invisível", entretanto, não pode realizar seu trabalho adequadamente se existirem impedimentos ao livre comércio. Smith, portanto, acreditou no livre comércio e se opôs fortemente às altas taxas. Na verdade, ele reagiu de forma enérgica à maioria das interferências governamentais no comércio e no mercado livre, que ainda segundo ele, quase sempre diminuíam a eficácia econômica e, por fim, resultam em preços mais altos para o público (Smith não inventou o laissez faire, mas promoveu mais do que ninguém a adoção desse conceito).

Não é correto dizer que foi um apologista dos interesses dos negociantes. Ele denunciava repetidamente as práticas mercantis monopolistas, solicitando a sua eliminação.

Apesar de a teoria econômica moderna ter adicionado novos conceitos e técnicas, ela é, basicamente, um desenvolvimento natural economia clássica. Cópia de trechos de (HART, Michael H. As 100 maiores personalidades da história. Uma classificação das pessoas que mais influenciaram a história. Rio de Janeiro: DIFEL, 2001.)

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Norberto R. Keppe, da Trilogia Analítica, faz as seguintes observações sobre Adam Smith:

1) Pensamento Mercantilista: o dinheiro como uma riqueza.

2) Todo o valor no trabalho que gere dinheiro.

3) Total liberdade para o Comércio Externo que traz moedas.

4) A riqueza advindo do Consumismo.

5) Destruição dos valores culturais, artísticos, industriais.

Inversão total da civilização



11 outubro 2005

Pechincha e Barganha

mercado é um lugar onde as pessoas compram e vendem bens e serviços na expectativa de obter uma vantagem. Que tipo de conflito estaria em evidência nesta relação? As pessoas, diferentes umas das outras, nem sempre são conhecedoras de toda a gama de bens, de modo que elas podem estar em conflito se compram ou não um determinado produto. Porém, não é esse o conflito que existe entre comprador e vendedor.

O conflito entre comprador e vendedor é caracterizado pela razão de troca, ou seja, pelo estabelecimento do preço de um bem. Quer dizer, enquanto o vendedor quer oferecer o produto pelo maior preço, o consumidor quer adquiri-lo pelo menor. É no intervalo entre o maior preço ofertado e o menor preço procurado, que o conflito terá sua solução. À disputa entre o maior e o menor preço, denominamos de pechincha. Pechinchar é, pois, diminuir ao máximo o preço oferecido pelo vendedor.

Numa relação de troca, o consumidor irá pechinchar até encontrar o preço de equilíbrio para o bem em questão. No Oriente esta prática é comum. Por outro lado, os Quakers, no século XVII, fixavam os preços para as suas mercadorias e recusavam qualquer tipo de pechincha, alegando que se alguém pechinchava é porque havia uma expectativa de que o que eles recebiam não era verdadeiro. Este fato deu origem ao que conhecemos hoje como preço fixo.

Gradualmente, entretanto, o costume tornou-se quase universal e raramente discutimos os preços, principalmente quando vamos ao supermercado ou grandes magazines. Observe a compra num supermercado tradicional: pegamos um carrinho, enchemo-lo de mercadorias, passamos pelo caixa, pagamos e vamos para os nossos lares. Não vem à nossa mente discutir o preço com o dono do supermercado. Podemos deixar de comprar, caso achemos que o preço do produto é mais convidativo em outro lugar, mas não regateamos com o dono do supermercado para levá-lo por um preço menor.

preço fixo tornou uma constante, mas isso não que dizer que podemos estabelecer qualquer preço arbitrariamente. Basta, por exemplo, observar a postura de um atravessador: a maioria de nós imagina que ele ganha tanto quanto quer, ou fixa o lucro que quer. Isso não é uma verdade, porque se ele contrariar a lei de oferta e demanda, poderá perder a sua posição no mercado, visto os produtores e consumidores organizarem as suas trocas de outra forma.

Saibamos pechinchar, mas não nos tornemos egoístas, a ponto de querer amealhar todo o lucro da troca somente para nós.

Fonte de Consulta

BOULDING, K. E., Economic Analysis. USA, Harper & Brothers, 1941.


09 outubro 2005

Economistas Filósofos

Há uma porção de homens com uma espécie de fama curiosa. Eles não comandaram exércitos, não enviaram homens à morte, não administraram impérios, não tomaram parte nas decisões históricas. Poucos deles ficaram famosos, mas nenhum tornou-se um herói nacional. Contudo, o que eles fizeram foi mais decisivo do que a fama dos grandes líderes políticos: eles, mesmo aparentemente apagados, formaram e influenciaram a racionalidade de muitas pessoas. Eles são os economistas filósofos.

Lord Keynes já nos dizia que as ideias dos economistas e dos políticos filósofos, quer certas ou erradas, são mais poderosas do que comumente se pensa. Os homens práticos, que se julgam isentos de tais influências são muitas vezes escravos de um economista já falecido. O estadista louco age premido por vozes que se encontram no ar. É através dessa voz que ele vai administrar o dia a dia de milhões de pessoas. Dessa forma, Keynes acha que o desenvolvimento das ideias é mais importante do que todos os interesses pessoais do rei, do presidente ou do governador.

Esses grandes economistas eram de vários países, de vários modos de vida e de diversos temperamentos. Alguns brilhantes, outros grosseiros; alguns fizeram fortuna e outros não souberam administrar as suas próprias finanças. Seus pontos de vista acerca do mundo variavam de acordo com suas fortunas. Uns defendiam os direitos das mulheres, enquanto outros achavam a mulher inferior; os economistas ricos escreviam contra a riqueza e os economistas pobres contra a caridade.

Contudo, no meio dessas divergências havia uma característica comum: todos estavam fascinados pelo mundo que os rodeava, pela sua complexidade e pela sua aparente desordem. Todos estavam absorvidos na análise do comportamento dos seus semelhantes, primeiro pelo modo como criavam a riqueza material e depois pela forma como pisavam o pé do vizinho para conseguir uma parte dessa riqueza. Estavam, por fim, interessados em compreender o fascínio da luta pela riqueza e pela vida.

Quem pensaria em procurar ordem e forma no interior de uma família pobre ou num especulador à beira da ruína, ou leis de consistência e princípios numa multidão à busca de riqueza ou numa hortaliceira sorrindo aos seus fregueses. É esta procura de ordem e de sentido na história social que está o centro da ciência econômica. É esse esforço para juntar a parte com o todo que dá aos grandes pensadores elementos para arquitetar um mundo ideal, em que até a utopia é factível e digna de ponderação.

Saibamos observar a ordem, mesmo quando tudo parece ir contra. Há uma lei mais perfeita que rege todo o movimento de nossas ações: é a lei natural.


04 outubro 2005

Cidade de Deus, A

A Cidade de Deus, de Santo Agostinho (354-430), bispo de Hipona, exerceu sobre a história das doutrinas uma das mais diversas e duráveis influências. Ela fascinou a Idade Média. Ela inspirou Bossuet em seu Discours sur l’histoire universelle. Foi conservada por Augusto Comte no catálogo de sua Bibliothèque positive. Suscitou até o século XX o interesse vivo dos historiadores filósofos e teólogos.

O pensamento político contido na Cidade de Deus forja-se no encontro de duas tradições: a da cultura greco-romana e a das Escrituras judaico-cristãs. Da Antiguidade grega Agostinho retém as ideias de Platão (República e Leis). Traça, assim, os planos de uma cidade ideal, a Cidade de Deus, em contrapartida com a da cidade terrestre, em que predominam a guerra, a injustiça, o egoísmo etc. Para ele, a verdadeira administração de uma cidade deve estar baseada na justiça, e esta por sua vez na caridade, ensinada por Cristo.

Para Agostinho, os indivíduos pertencem sempre a um grupo-família, cidade, reino ou império. Isso é um fato essencial: a relação de cada homem com a sociedade é tão estreita quanto a de uma letra com a frase. Mas a palavra civitas não significa apenas "cidade": significa também o Estado Imperial. Logo, a existência de um grupo supõe, para Agostinho, um acordo de base — qualquer que seja o objeto — e revela, por isso mesmo, uma disposição fundamental do ser humano.

Sua teologia da história política é dada pela sucessão de seis épocas: de Adão ao Dilúvio; do Dilúvio a Abraão; de Abraão a Davi; de Davi à deportação para a Babilônia; dessa deportação ao nascimento de Cristo; e, por fim, desse acontecimento ao fim dos tempos, que será ele próprio o advento de um "sétimo dia". Para Agostinho, Cristo inaugurou uma nova época: com sua morte redentora na cruz, ofereceu às cidades terrestres a oportunidade de se converterem à Cidade de Deus.

Há muitas interpretações da Cidade de Deus. Alguns falam em terceira cidade, outros comparam a Cidade de Deus à Cidade do diabo. Outros ainda transcendem-na ao estado de uma Cidade celeste, ou seja, nesta cidade os indivíduos buscam a perfeita harmonia com as leis de Deus. Por isso, o indivíduo quando colocado num cargo público deveria sacrificar os seus interesses pessoais em prol do bem público, o verdadeiro bem celestial.

O pano de fundo de sua obra é o da eterna luta entre o bem e o mal. Ceder aos apetites da cidade terrestre é um mal; agir de acordo com os preceitos da Cidade de Deus, um bem que deve ser procurado a qualquer custo.

Fonte de Consulta

CHÂTELET, F., DUHAMEL, O. e PISIER, E. Doutrina de Obras Políticas. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1993.

 

02 outubro 2005

Fatos e Teorias

Deem-me "fatos" e não "teorias" é a queixa que mais frequentemente se ouve. A queixa pode ser justificada em protesto contra as teorias que não têm base nos fatos, mas usualmente cresce em função da incompreensão do relacionamento entre os fatos e as teorias. Contudo, para se chegar a um conhecimento profundo de um objeto, deve-se empreender maciços estudos teóricos.

Suponhamos, por exemplo, a compra de manteiga feita pela Senhora X. Para o economista, o fato relevante é a quantidade de manteiga recebida e o dinheiro gasto pela Senhora X, ou seja, taxa de troca estabelecida. O sorriso e a amabilidade do vendedor somente serão importantes se tiverem alguma influência na diminuição do preço da manteiga, quando comparado com outros estabelecimentos de venda do referido produto.

Suponhamos, também, que Oliver Cromwell tem uma verruga na ponta do seu nariz. Mas o que constitui este suposto "fato"? Para o químico é uma certa aglomeração de átomos e moléculas. Para o biólogo é uma certa impropriedade no comportamento das células. Para o psicólogo pode ser a chave para o conhecimento do caráter comportamental de Cromwell. Para o economista, o fato não tem significação nenhuma, a não ser quando ele tenciona despender alguns dólares na sua remoção. Qual é o fato sobre a verruga? Pode ser qualquer um dos acima citados, dependendo do esquema de interpretação adotado.

Tomemos, ainda, o exemplo da Senhora X que foi à mercearia comprar manteiga. Para o economista, como dissemos, o que vale é o preço e a quantidade de manteiga comprada. Para o oficial da saúde pública, o que interessa é verificar a composição química e bacteriológica da manteiga. Para o numismático, o que vale é observar as inscrições das moedas transacionadas. Como aqueles que dizem quero "fatos" e não "teorias", arrumar-se-iam para explicar os diferentes ponto de vista sobre o mesmo fato?

Na realidade, para observar com êxito, precisamos dos fatos que se escondem atrás dos objetos. Isso faz-nos selecionar. A nossa escolha é importante, porque ela mostra a estrutura mental que está atrás do conteúdo do fato observado. Dessa forma, o verdadeiro conceito de relevância implica a existência de uma teoria, porque os fatos serão relevantes somente em relação a algum corpo de princípios. Sem isso, caímos na verbosidade das palavras vazias.

Observemos fielmente os objetos. Não esperemos que os outros tenham a mesma visão que a nossa. O importante é dar a nossa contribuição ao fato. Somente assim construiremos um sólido edifício dos conhecimentos verdadeiros.

Fonte de Consulta

BOULDING, K. E., Economic Analysis. USA, Harper & Brothers, 1941.

 

01 outubro 2005

Parlamentarismo Versus Presidencialismo

Aristóteles (384-322) estabeleceu a classificação ainda hoje adotada das formas de governo: a monarquia, em que o poder se concentra em uma pessoa; a aristocracia, em que o poder se concentra num grupo de pessoas; a democracia, em que o povo exerce o poder através de representantes eleitos. Essas formas variaram muito através dos tempos, passando pela ditadura, pelo absolutismo, pelo poder do exército etc. Cabe-nos, aqui, discutir a relação que há entre o parlamentarismo e o presidencialismo, formas de governo de um regime democrático.

As experiências mais marcantes do regime parlamentarista encontram-se na Grã-Bretanha; as do regime presidencialista, nos Estados unidos. No Brasil, tivemos pouca experiência com o parlamentarismo, de modo que não deu para avaliar se foi boa ou má. Sempre se optou pelo presidencialismo.

No sistema parlamentar, o Governo assenta na confiança política do Parlamento. Há três órgãos políticos, ou seja, o Chefe de Estado (rei ou presidente), o Parlamento e o Governo. Há nítida diferença entre as funções do Chefe de Estado e Chefe de governo. O Chefe de Estado, neste regime, tem uma atuação puramente simbólica ou competência muito reduzida. A administração da coisa pública se faz através de um Gabinete que, coletivamente, decide sobre os rumos do país.

No presidencialismo, as funções de Chefe de Estado e Chefe de Governo se assemelham. Neste caso, a responsabilidade pela condução do país recai sobre os ombros do presidente. Embora tenha um Parlamento, que lhe dá sustentação, a decisão final está em suas mãos.

Quando a gestão do bem público é bem coordenada, tanto faz um sistema quanto o outro, pois o que está em jogo é a competência ética, moral e intelectual de seus líderes. E quando há uma crise política? Nesta situação, o regime parlamentarista é mais viável, pois o Chefe de Estado pode dissolver o Gabinete e convocar novas eleições para substituir o Parlamento. O mesmo acontece se o presidente não estiver agindo a contento. O seu afastamento é feito sem traumas e com um custo baixíssimo para o país em questão.

Observe a situação atual do Brasil, com sua forma presidencialista. Houve uma denúncia de corrupção. Suspeita-se que o presidente esteja envolvido. Mas, até chegar em sua pessoa tem que percorrer muitos caminhos. Para isso, formam-se CPIs e mais CPIs, com um custo elevadíssimo para os cofres públicos: água, luz, transporte, desgaste físico, papéis e mais papéis etc. Sem contar os projetos que não foram votados e que poderiam auxiliar numa melhor distribuição dos recursos do contribuinte.

É preciso, pois, repensar a reforma política, no sentido de proporcionar uma melhor representação dos anseios do povo brasileiro, com uma drástica redução dos custos de seu funcionamento.